COISAS QUE VÃO CONTRA A ASTROLOGIA
Por Otávio Azevedo
O excerto abaixo foi extraído de uma coluna sobre astrologia de um
jornal português publicada em janeiro de 2013:
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“Os planetas influenciam não só as pessoas, como todos os seres vivos e
toda matéria orgânica do sistema solar. Além do efeito gravitacional, cada
planeta emana uma energia distinta como se fosse o refletor de uma determinada
luz do espectro solar, uma espécie de foco eletromagnético e radioativo que
interage com todas as partes do sistema.
(...) Em astrologia, um planeta emite uma energia muito própria que se
traduz numa tipologia comportamental quando relacionamos esse planeta com a
estrutura da psique. .”
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Trata-se de uma afirmação pujante que pode impressionar quem não tem familiaridade
com métodos e teorias científicas. E muitos que iniciam o estudo da astrologia
se encontram nesse caso.
De um modo geral, a ânsia de interpretar o esquema simbólico de uma
carta natal faz com que os que iniciam nesse estudo saltem sobre a base
filosófica que sustenta a astrologia, mas isso, por si só, não seria um
problema. Um mecânico pode consertar muito bem um carro sem que tenha
conhecimentos básicos sobre a física ou mecânica newtoniana. Um trapezista pode
executar lindos movimentos no trapézio sem a necessidade de conhecer as leis da
cinemática. Da mesma forma, um astrólogo pode trabalhar muito bem com a
astrologia sem que conheça seus fundamentos. O problema começa quando o
mecânico, o trapezista, o astrólogo, etc – na tentativa, talvez, de passar uma
aura de credibilidade e glamour aos seus ofícios – tentam elaborar uma teoria
sobre aquilo que na prática executam muito bem, mas que nos fundamentos
filosóficos e conceituais desconhecem. É nesse ponto onde podem cometer algumas
barbaridades... E isso é, de certa forma, usual no meio astrológico.
Aqueles que lidam com a astrologia se vêem constantemente diante das
dúvidas e ironias dos incrédulos e alguns acabam assumindo o desafio de
convencer (ou converter) os leigos sobre a validade do saber astrológico...
Tem-se aí um campo bastante propício à criação de teorias escalafobéticas,
totalmente improváveis, revestidas de uma aura “científica” misturada a axiomas
herméticos com salpicadas de holografia e mais alguns temperos energéticos e quânticos
que formam um caldo de esquisitices onde tudo pode ser afirmado sem que nada
possa ser provado... Como na citação acima, que não é passível de ser
comprovada por método algum, pelo menos nos dias de hoje.
Tenho uma forma de verificar quando alguém não sabe exatamente o que é a
astrologia em sua essência e faz questão de deixar isso claro: é quando fala
com desenvoltura em “influência dos astros”, coisas do tipo “os planetas
inclinam mas não obrigam” ou, melhor ainda, de certas “energias advindas dos planetas”
que fazem acontecer coisas e provocam certos temperamentos nas pessoas - em
todos os casos sugerindo um elo causal entre os planetas do Sistema Solar e os
acontecimentos aqui na Terra.
No meu modo de ver, nos dias de hoje nada prejudica mais a astrologia,
na sua sofrida trajetória de afirmação como um saber válido e precioso, do que
essa tentativa inglória de torná-la “mais bela e aceitável” através de
explicações equivocadas via “energias” e “influências planetárias”,
misturando-se vários ingredientes incompatíveis numa inacreditável sopa de
baboseiras que só fazem por desacreditá-la e torná-la cada vez mais parecida
àquilo que se chama de charlatanismo. A astrologia não merece isso, muito menos
vindo do seu próprio meio, mesmo que sob nobres intenções de fazê-la parecer
uma “linda moça”. Vamos repetir a citação:
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Além do efeito gravitacional, cada planeta emana uma energia distinta
como se fosse o refletor de uma determinada luz do espectro solar, uma espécie
de foco eletromagnético e radioativo que interage com todas as partes do
sistema.”
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Uma pessoa lógica e com alguma base em metodologias científicas poderia
fazer várias perguntas sobre esse excerto, por exemplo:
Onde se encontra a comprovação dessa afirmativa? Como foi provada? Que
teoria científica a sustenta, já que estamos falando de forças e energias, que
estão sob a égide da ciência? Trata-se de Física Quântica, Teoria da
Relatividade, Teoria M, Teoria das Cordas, Teoria dos Campos Morfogenéticos,
afinal, o que corrobora isso? E se isso fosse mesmo verdade, porque entram no
jogo apenas os planetas e não cada estrela, buraco negro, nebulosa, galáxia,
asteróide, poeira cósmica, alien, satélites, etc, colocando o universo inteiro
na parada? Ou seja, se os planetas influenciam, então porque o resto do cosmo
inteiro não entra na jogada? E tudo isso não teria que estar nos mapas natais?
E se a atração gravitacional fosse importante, então Plutão teria uma
“influência” bem menor que o médico parteiro do bebê, cuja atração gravitacional
é muito maior sobre o recém nascido, e, portanto, deveria constar no mapa,
assim como o anestesista, a enfermeira, etc. Se o que está em jogo é algum tipo
de “energia”, teremos que incluir tudo isso no mapa porque a energia está em
tudo, seja gravitacional, eletromagnética, radioativa ou lá o que for.
Enfim, fica claro que a afirmativa acima não tem nenhuma sustentação
científica, esotérica, causal ou casual. Não é possível de ser confirmada por
nenhum tipo de verificação, seja por algum artefato ultra-moderno ou órgão dos
sentidos, sejam estes últimos físicos ou extra-físicos. Na verdade, a afirmação
acima é uma construção para justificar a astrologia usando uma terminologia
pretensamente científica e torná-la “aceitável” nos dias de hoje.
Mais adiante, o mesmo artigo parece querer buscar alguma ancoragem no
poeta, filósofo e escritor português Fernando Pessoa, ao afirmar:
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“Não foi por acaso que Fernando Pessoa, num dos seus ensaios inéditos,
designa a astrologia como a “Ciência das Ciências”
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Realmente não é de hoje que se vê essa tentativa de tornar a astrologia
a “ciência das ciências” como cita esse artigo, que atribui esse epíteto a um
comentário de Fernando Pessoa. Respeitando a obra poética e o conhecimento
astrológico de Fernando Pessoa, este célebre autor não teria estatura
astrológica para figurar numa referência de mestres ou autores que
verdadeiramente contribuíram para o avanço e entendimento da astrologia. Até
mesmo porque, se assim fosse, teria que dedicar boa parte de sua vida única e
exclusivamente ao estudo e prática da astrologia, o que não foi o caso. Assim,
por vezes, cita-se Fernando Pessoa – escritor, poeta, filósofo - como
referência para a astrologia, quando deveria ser citado apenas como um
admirador e praticante eventual. Analogamente, Einstein gostava da “Doutrina
Secreta” de Helena Blavatsky (dizem que era seu livro de cabeceira) mas seria
absurdo citá-lo como referência sobre ocultismo, ou insinuar que a simples
apreciação de Einstein pelo ocultismo fosse prova “científica” das teorias
expostas na Doutrina Secreta. Mas muitos pegam essa trilha equivocada, tentando
ancorar suas próprias conclusões, muitas vezes equivocadas, em fontes de
notório saber – mas que não serviriam como referência no campo em questão – e
pretendendo, dessa forma, colher algum traço de aceitação e credibilidade
naquilo que tentam alegar.
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