sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

A condição de mártir de Assange prejudica ainda mais a reputação dos EUA




A prisão em Londres do fundador do WikiLeaks, Julian Assange, foi manchete em todos os grandes jornais alemães na quarta-feira. Vários dos órgãos de imprensa observaram como a notícia foi bem recebida nos Estados Unidos e os editorialistas questionaram qual é o significado do conceito de liberdade de informação na última superpotência restante no mundo. 
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A prisão ocorreu no momento em que Assange, o fundador do WikiLeaks, de 39 anos de idade, enfrenta pressões crescentes de todas as partes do mundo – da Suécia, dos Estados Unidos e até mesmo do seu país natal, a Austrália –, após a divulgação de vazamentos diplomáticos dos Estados Unidos que foram publicados pelo seu website e por várias organizações de imprensa, incluindo “Der Spiegel”.
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Na sua resposta publicada na quarta-feira no jornal “The Australian”, Assange chama a sua organização de “underdog” (vítima de injustiça e perseguição) e escreve: “A primeira-ministra Gillard e a secretária de Estado Hillary Clinton não reservaram uma só palavra crítica para as outras organizações de mídia porque “The Guardian”, “The New York Times” e “Der Spiegel” são instituições grandes e antigas, enquanto que o WikiLeaks é ainda jovem e pequeno”.
Ele afirmou ainda que o governo australiano está tentando “matar o mensageiro porque não deseja que a verdade seja revelada, incluindo informações sobre as suas próprias atividades diplomáticas e políticas”.
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A porta-voz do WikiLeaks, Kristinn Hrafnsson, escreveu no Twitter: “Nós não seremos amordaçados, seja por ação judicial seja por censura corporativa”.
A organização de notícias Agence France Presse noticiou na quarta-feira que hackers simpatizantes de Assange atacaram o sistema de e-mail da promotoria pública sueca em resposta à prisão.
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O jornal de esquerda “Berliner Zeitung” disse: "A reputação dos Estados Unidos foi prejudicada pela divulgação controlada de documentos secretos pelo WikiLeaks. Isso é verdade... Mas a reputação dos Estados Unidos está sendo muito mais prejudicada neste momento à medida que eles tentam – com todos os meios ao seu alcance – amordaçar o WikiLeaks e o seu diretor, Julian Assange. Ao fazerem isso, os Estados Unidos estão traindo um dos mitos originais da sua fundação: a liberdade de informação. E eles estão fazendo isso agora porque, pela primeira vez desde o fim da Guerra Fria, veem-se diante do risco de perder o controle mundial das informações.


'A primeira guerra real da informação teve início', escreveu o ativista de direitos civis dos Estados Unidos John-Perry Barlow. 'E o campo de batalha é o WikiLeaks.' Ele tem razão. Com a doutrina do 'Livre Fluxo de Informações' os Estados Unidos dominaram a transmissão de informações e a maior parte do conteúdo informado durante décadas. Eles diziam que toda pessoa tinha o direito, em qualquer lugar, e sem limitações, de coletar informações e de transmiti-las por rádio e televisão e de disseminá-las. Essa era uma doutrina tremenda, com a condição de que apenas as companhias norte-americanas tivessem o poder, os meios e as capacidades logísticas para fazer uso dessa liberdade. Essa situação mudou um pouco com a internet, mas companhias como a Apple, a Microsoft, o Google, o Facebook e a Amazon ampliaram o domínio dos Estados Unidos no supostamente democrático ciberespaço. Julian Assange e o WikiLeaks são os primeiros a usar o poder da internet contra os Estados Unidos. É por isso que eles estão sendo impiedosamente perseguidos. E é também por isso que o governo norte-americano está traindo um dos princípios da democracia”.

Já o conservador “Die Welt” disse o seguinte:“A promotoria pública sueca deseja simplesmente questionar o australiano Assange a respeito de sérias acusações que foram feitas contra ele. Até o momento, Assange recusou-se a explicar os fatos. Os seus simpatizantes acreditam que isso tudo não passa de uma armação e que as acusações de estupro foram fabricadas com o objetivo de atingir o projeto WikiLeaks.

Se isso for verdade, tanto as suecas, que Assange não nega conhecer, quanto a promotoria sueca devem estar seguindo uma agenda secreta ditada pelos Estados Unidos. Até agora, não houve um fragmento de prova sequer que pudesse fazer com que tal hipótese fosse levada a sério. Na Suécia, a questão não diz respeito aos danos políticos causados pelo ativista do WikiLeaks. 
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A reputação já prejudicada dos Estados Unidos sofrerá uma degradação ainda maior com o novo status de mártir de Assange. E é questionável a esperança declarada dos Estados Unidos de que o WikiLeaks desaparecerá de cena juntamente com Assange. Uma plataforma como o WikiLeaks deverá conseguir sobreviver sem um líder específico, que era tão glamouroso quanto polarizador, e cuja estilo autocrático de liderança lhe custou importantes funcionários há alguns meses”. 


El País 

Mary Beth Warner e Jill Petzinger

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